quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

CAPÍTULO 7

Um fim para Sophia – Parte 2

Acordou e estava com seus 70 anos, morava sozinha num pequeno apartamento. Seus filhos e netos a visitavam. Alguns moravam próximos a ela, mas após o falecimento do seu segundo marido a solidão era algo comum em sua vida.

Tentava manter contato com seus amigos, mas com o envelhecimento aprendeu a lidar com algo que se tornou comum a sua vida: a morte. Thiago, Edson e Ricardo haviam falecido. Teve notícias de David, sua grande paixão da faculdade, estava em uma casa de repouso, demenciado. E Márcia, ah Márcia...... essa estava vivinha, mas morava em outro estado e a idade fez com que ambas tivessem cada vez menos disposição para grandes viagens. Pelo menos por telefone e email estavam sempre em contato.

Tentava manter uma rotina, por um tempo fez exercícios, caminhadas, mas sua disposição diminuiu e essas atividades físicas também. Um dia foi fazer compras no mercado, próximo de sua casa. Resolveu cozinhar coisas diferentes, se dar um jantar de presente. Fez quiche, comprou uma sobremesa e vinho.

Bebeu todo o vinho, embriagada foi procurar fotos, encontrou algumas de sua infância, adolescência, juventude...dos seus dois maridos - um ex no caso, ambos falecidos - filhos, netos, lugares que visitou. Espaços políticos que circulou.
Sua vida em uma organização política durou pouco, não tinha paciência para contradições tão grandes entre os que se diziam revolucionários. Bem, poderiam chama-la de purista, ela gostava de dizer que tinha princípios. Assim, manteve-se próxima de alguns partidos, mas sempre preferiu a liberdade – e talvez o egoísmo – de ser uma militante independente. De qualquer forma, era bem atuante e simpatizava com diversas pautas.

Sua vida no entanto, não serviu para consolidação de um projeto político. A esquerda, assim como era na sua juventude, não se tornou uma alternativa real para a classe mais explorada e oprimida. De todas as suas frustações, essa era a maior.

Lembrou-se de outras fotos, foi buscar na parte de cima do guarda-roupa. Escalou, no entanto sua perna vacilou e caiu de costas, batendo a cabeça no chão. Segundos depois acordou, sentiu uma dor forte na cabeça passou a mão, era sangue.

Estava bem confusa, arrastou-se até a cozinha e pegou o interfone e ligou para a portaria. Antes de desmaiar novamente, só conseguiu dizer “Sofri um acidente”.

Um dia depois, no velório de Sophia estavam seus filhos, netos e outros familiares, alguns amigos, alguns não-amigos. De todos que ali estavam, era óbvio que Márcia era a mais inconsolável.

“Sophia” – ela dizia.
“Sophia, Sophia, vamos está na hora! Só temos o dia de hoje para nos despedirmos. Você que sempre diz que as despedidas são importantes!”

Sophia acordou, de um sonho profundo, coração acelerado. A angústia permanecia, tinha marcado um dia para ficar de bobeira com Márcia,  irem ao cinema, livraria, comer besteiras...conversar. À noite combinaram uma cerveja com Thiago, Edson, Ricardo e outros colegas, além do namorado – futuro primeiro marido – de Sophia.

Sentadas em um café, Sophia disse: “Tive um sonho maluco” – “Sobre o que?” – “Sobre a vida, algo bem complexo, envelhecimento, não sei se que quero falar sobre isso” – “Você que começou... de qualquer forma, bonita, a vida é algo bem louco mesmo. Mas até a loucura tem sua própria lógica.”

Ambas riram, Sophia um riso nervoso.

domingo, 29 de novembro de 2015


CAPÍTULO 6

Um fim para Sophia – Parte 1

Sophia concluiu sua graduação em 2012. No ano seguinte, ingressou no mestrado e defendeu sua dissertação no início de 2015. Nesse ano resolveu dar um respiro da vida acadêmica, voltar a ler literatura. Tolstoi cada vez mais a fascinava, assim como a acidez F. Scott Fitzgerald Virginia Woolf a deixava apreensiva e agustiada, mas todas as suas passagens e viagens pela literatura valia a pena, pois a tirava de um lugar confortável. Nas horas vagas, rascunhava um projeto para doutorado, mas sem se pressionar e sem se levar pela pressão de seu antigo orientador.

Mas há tempos não estava em lugar confortável. Ela ainda morava com Márcia, mas algumas definições em sua vida a inquietava. Namorava há 2 anos e pensavam em morar juntos.

“Será¿ Será que a relação não irá esfriar... ou vamos virar um casal siamês, sem vida social. Será¿” Seu namorado por outro lado, apesar de também relatar insegurança, estava muito animado, o que de certa forma a deixava mais segura.

“Mas nenhuma decisão é definitiva, no mundo das relações afetivas”. Dizia isso para si mesma, talvez para um conforto psíquico.

De qualquer forma teria que mudar de casa, Márcia vai se mudar. Outro ciclo se fechando. Sua relação de amizade com Márcia é mais longa do que qualquer uma na sua vida. Não mais longa do que com seus pais, evidentemente, mas estava pensando nas relações voluntárias, aquelas que escolhemos para nossas vidas... se afastar dela ia ser difícil.

Ao ir morar com o namorado, todos a olhavam como “a casada”, o que em si não é um problema, mas era como se isso a desvalorizava como mulher independente. Então, se você não namora é porque ninguém te quer, se namora é porque é insegura, se vai morar com o namorado é porque não banca levar uma vida de independente de alguém, se mora sozinha e não quer morar com nenhum namorado é porque na verdade são seus namorados que não quiseram morar com você.

Estava com raiva de tudo e de todos por pensarem assim. Mas todos pensam assim ou eram questionamentos seus também¿ Estava com raiva dos outros ou de si por sua insegurança¿

A decisão estava tomada e as mudanças aconteceriam. Não deveria se sentir culpada por estar com dúvidas, de qualquer forma, “é melhor o por vir ser novo do que a ter as mesmas roupas velhas”.

terça-feira, 24 de novembro de 2015

Melhor ainda é poder voltar quando quero

Foi simples assim. Reler o que já escrevi, reviver as criações, refletir sobre as diversas questões que nos atravessam na juventude.
Há quase seis anos deixei adormecida em mim a necessidade da escrita. Parti para ações. Erro grande achar que escrever não é uma das grandes ações revolucionárias da humanidade. É evidente que forma e conteúdo são indissociáveis, mas com certeza os grandes livros revolucionários são tão potentes quanto mil balas de canhões.

Algo que me incomoda em séries, filmes, livros, na vida é a falta de um final. Vamos combinar que isso não é exclusivo da minha pessoa. Ou um dos grandes debates do mundo da internet é ou não é o final do desenho "Caverna dos Dragões"? Por isso, à minha personagem darei um final, apesar de ainda ser minha interlocutora, não será mais uma personagem de uma história. Pretendo retomar as reflexões, mas não mais os capítulos das diversas histórias. A volta a escrita, também parte de uma necessidade de mudança da minha narrativa.
A você Sophia Beauvoir te darei um fim, uma despedida. Porque a vida é feita disso, encontros e despedidas.

"Mande notícias do mundo de lá
Diz quem fica
Me dê um abraço, venha me apertar
Tô chegando
Coisa que gosto é poder partir
Sem ter planos
Melhor ainda é poder voltar
Quando quero"