segunda-feira, 27 de abril de 2009

CAPÍTULO 2

‘Todo dia ela faz tudo sempre igual’

Ela acordou 6h45, não queria ir trabalhar. Estava cansada, indisposta e de manhã estava sempre irritada.
Márcia acordava um pouco antes, já tinha usado o banheiro. Pouco se falavam pela manhã.
“Bom dia”. ‘Bom dia’.
Depois do banho foi para cozinha preparar sua refeição habitual: leite com café instantâneo e pão com manteiga.

Sai de casa praticamente uma hora depois de ter acordado, vai para o metrô a pé.
Sai gente. Entra gente. Não entra, tem que esperar o próximo. Sai gente. Entra empurrada. ‘O que fiz para merecer isso?’

Ela trabalha meio-período em uma ONG. Essa instituição ajuda a organizar campanhas para envio de alimentos e roupas a lugares que, por algum motivo, estão em crise - guerra, seca, enchentes, desgraças por causas naturais ou desgraças por causas humanas.
Lá trabalhavam pessoas com as mais diversas formações: advogados, publicitários, administradores, geógrafos, cientistas sociais...
O seu trabalho consistia em estudar em equipe a situação de cada país ou local afetado, entrava em contato com os consulados, governos municipais. Após o estudo dos acontecimentos e feitos os contatos, organizavam um projeto para divulgar a situação – seja em rádio, TV , paróquias, além de receberem as doações e garantirem que os donativos chegassem aos afetados – o que nunca era REALMENTE garantido.
Aparentemente todos no seu serviço eram felizes, estavam contentes com seu trabalho e muitos gostavam de propagandear como eram bons: “além de termos um belo trabalho, estimulamos as pessoas a fazerem algo pelo próximo”.

‘Se enganar tudo bem...mas enganar o próximo deveria dar cadeia!’ - Pensava ao ouvir isso.

Duas vezes por semana, à tarde, tinha outra atividade na sua própria faculdade, fazia Iniciação Científica, ajudava um professor conceituado em sua pesquisa sobre a organização do trabalho hoje e o papel do Brasil nesse novo contexto.
Ela gostava do tema e ficou muito contente em conseguir a iniciação. Mas o seu orientador não era exatamente a pessoa mais agradável.
“Oi mocinha! Tudo bem?”. M-O-C-I-N-H-A !!!!
Além de tratá-la como criança ouvia constantemente piadas de mau gosto, machistas e algumas vezes sentia que ele flertava com ela. Se fingia de boba... mas ficava extremamente triste. Chegava a duvidar que conseguiu a iniciação por mérito.

Estava cansada.... e agora sabia pelo menos dois dos motivos que causavam esse cansaço. Escreveu:

“As contradições me cercam: no meu trabalho, na minha iniciação.
Ao mesmo tempo em que reflito sobre a contribuição da ONG que trabalho na manutenção das contradições sociais, ao dar uma falsa impressão que o ‘faça você mesmo’ tem resultados, sou oprimida diariamente com piadinhas machistas e com a falta de credibilidade no meu trabalho, na minha capacidade de ser uma boa pesquisadora.
O opressor e o oprimido. A opressora e a oprimida estão na minha pessoa. Só alguém muito insensível não se abalaria ao chegar nessa conclusão.”

sábado, 25 de abril de 2009

SAMBA DA MAIS VALIA
http://www.youtube.com/watch?v=l5Il0h5scIY

ENSAIO

A Inocência é Loucura
“Perguntas centrais: O que é a humanidade hoje? O coletivo? O Individual? As opressões? O homem? A mulher? O trabalhador? O camponês?

Tarefa central: Agir, não só refletir.”


CAPÍTULO 1

Comer, dormir, assistir, ouvir. Dormir, comer, ouvir, assistir. – bocejo – Vida melancólica. Sem sentido.
Ela vivia, ou vegetava, não sabia ao certo. Só sabia que algo a incomodava, sempre... maldito incômodo, nasceu com ele!
Na sua vida existiam os altos e baixos, mas o incômodo, ah esse sempre estava lá...

Com seus 22 anos, estudava Ciências Sociais na Faculdade – FFLCH, na Universidade de São Paulo. Esse mundo era confortável, pessoas jovens, bonitas, esclarecidas, politizadas – até demais! pensava.

- Vamos sair para beber hoje?
- Não Thi...hoje tá difícil...tô meio down. Acho que deve ser a TPM.
- Ah Jesus! Márcia me ajuda a convencer essa moça chatinha...vamos lá! Não precisamos sair da USP, vamos para ECA!

Márcia era uma das poucas amizades que permaneceu do colégio - Odiou o colégio, pessoas fúteis, meninas irritantes, garotos bobos, professores ditadores, só poucas amizades faziam sentido. A Universidade era outro mundo, graças a Deus!

- Bem, se ela não quer ir não posso fazer nada...mas sempre é bacana sair com os amigos. Acho que dá um UP!
- Beber, cair e levantar! É uma música muito poética. É a minha filosofia de vida!
- Nossa Ricardo, como você é besta! Vocês duas que sabem. Eu vou chamar o Nelson também, assim o quinteto fica completo! – ou não, mas pelo menos não vou ter que agüentar o bêbado sozinho.


A sabedoria estava em seu nome, mas na sua vida ela duvidava. Saiu com os amigos, bebeu, conversou, passou bons momentos, mas aquele sentimento ainda a perturbava, porém agravou-se, o vazio também se misturou com ele.
Depois foi para república com Márcia, que foi logo para cama. Mas ela precisava sentar, escrever, muitas vezes chorava, pensava em morte, não necessariamente na sua, mas do mundo, das coisas ao seu redor. Tudo transpirava morte - que para ela era o vazio.

Uma mulher jovem, classe média, brasileira, tinha um irmão mais velho, morava com a amiga, estudava, tinha um trabalho de meio período, cansada – não sabia do que. Tudo isso era ela........mas ela não era só isso.

“De tudo ficaram três coisas, escreveu Sabino, ‘a certeza de que ele estava sempre começando, a certeza de que era preciso continuar e a certeza de que seria interrompido antes de terminar. Fazer da interrupção um caminho novo. Fazer da queda um passo de dança, do medo uma escada, do sono uma ponte, da procura um encontro’.
Fora do contexto, poderia ser confundido com um trecho de um livro de auto-ajuda. Palavras proclamadas, divulgadas em revistas femininas de artesanato. Coitado de Fernando.
Apesar da divulgação estúpida e errada de trechos de seus livros, considero Sabino um sábio. Mas, belas palavras pouco me tocam nesse momento da minha vida. Do que vale meus estudos? As minhas viagens? Se eu não consigo compreender o que me cerca. Não é uma busca existencial....... eu sei.”

Seu celular emitiu uma música, não era uma ligação. Era uma mensagem.

‘Foi bom te rever, espero por mais encontros. Que tal nesse fim de semana?’

David era o seu nome. Ela não sabia o que sentia por ele, eram bons momentos, boas conversas. – Ele que me ligue depois – foi dormir.