domingo, 31 de maio de 2009

CAPÍTULO 3

"Os factos são teimosos"
Vladimir Ilich

Adorava viajar. Desde o preparo, compra das roupas, máquina – adorava tirar fotos.
Felizmente, para ela, teve oportunidades de ir a lugares muito interessantes. Com o término do colégio e após o vestibular seus pais a incentivaram a viajar com os amigos. Eles fizeram uma longa viagem pela América Latina – México, Cuba, Venezuela, Colômbia, Equador, Peru, Chile, Argentina e Uruguai. Era muito jovem, 18 anos apenas, mas tinha certeza que fez a viagem de sua vida.
Apesar de ficar nos albergues para juventude, não tinha o real contato com a população local...na realidade ficou mais interessada nas feirinhas e paisagens. Sua viagem não foi exatamente “Diários de Motocicleta”.
Mas ainda assim, foi uma grande aventura.
No fim de seu primeiro ano de faculdade resolveu fazer um curso de francês intensivo, foi muito interessante – dois meses, meio período de aula e meio período de passeio. No último mês fez algumas viagens por algumas capitais européias.
Assim, no fim de cada ano ela se organizava para uma longa viagem, principalmente para o exterior. Nos feriados aproveitava o Brasil.
Com o tempo passou a se dedicar, ler um pouco sobre a história dos locais que visitava, passeava não só em lugares turísticos e tentava realizar algum curso – não só línguas, mas esportes e artes. Escrevia sempre, suas impressões e pensamentos.

“Ah sim, depois da minha última viagem veio a maior crise. O maior incômodo. Aproveitei os ares europeus, o curso, as pessoas. Principalmente os brasileiros. E quando cheguei no aeroporto estava muito cansada, cheia de imagens e memórias na minha cabeça. Peguei um táxi e fui para a república, queria contar tudo para Márcia.
Ela não estava em casa e eu dormi a tarde toda. Quando chegou nos abraçamos mostrei algumas fotos que estavam na máquina, mas disse que precisava mostrar as outras depois, no computador. Ela sugeriu tomarmos uma cerveja em um barzinho e fomos. Sentamos, pedimos a bebida. Eu falava entusiasmada dos passeios, das pessoas, do curso. Em um certo momento fui interrompida, era uma criança, um menino de rua, me pediu dinheiro. Eu realmente não tinha, só estava com cartão e essa foi a minha justificativa.
Márcia viu que fiquei quieta uns instantes e brincou: ‘Não viu pobreza na Europa?’ Então respondi como um desabafo ‘Eu vi, mas não sei porque só me lembrei agora. Acho que quis ignorá-la’. ‘Ah minha amiga, há certas coisas que não podemos ignorar!’.
E essas palavras se tornaram a minha perturbação, pois antes eu conseguia, mas agora não. Não consigo mais. Não ignoro as contradições do mundo.”

segunda-feira, 25 de maio de 2009

O olhar...

DO PÚBLICO
quando se comporta de forma inapropriada
quando questiona demais
quando sorri demais
quando reclama demais
(obs.: o parâmetro é social, se fosse pessoal nunca seria demais para ela)

DO PRIVADO
quando está dormindo
quando é acariciada
que reprova e aprova de forma repetitiva
- o que sempre a irritava

“Olhar tem a vantagem de ser móvel, o que não é o caso, por exemplo, de ponto de vista. O olhar é ora abrangente, ora incisivo. O olhar é ora cognitivo e, no limite definidor, ora é emotivo ou passional. O olho que perscruta e quer saber objetivamente das coisas pode ser também o olho que ri ou chora, ama ou detesta, admira ou despreza. Quem diz olhar diz, implicitamente, tanto inteligência quanto sentimento.”

BOSI, A. Machado de Assis: O enigma do olhar (229 pp.). São Paulo, Ática. Psicol. USP vol.12 no.1, São Paulo, 2001.

segunda-feira, 4 de maio de 2009

"Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada... a dolorida...

Sombra de névoa tênue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!...

Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber porquê...

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!"

FLORBELA ESPANCA

Entre Capítulos...

"Da janela lateral do quarto de dormir
Vejo uma igreja, um sinal de glória
Vejo um muro branco e um vôo pássaro
Vejo uma grade, um velho sinal
Mensageiro natural de coisas naturais"

Se sente só, confusa...com pensamentos a mil.
Existe a fuga: baladas, a bebida e outras coisitas, as conversas fúteis.
Mas o que alivia é escrever, não escreve nem metade das suas reflexões, mas é o suficiente para aliviar.

Ah sim, ela não é tão anti-social...as boas conversas e companhias também ajudam nessa vida sem sentido.

...

Em alguns momentos quando escreve ouve uma música baixinho...queria ser compositora. Porque aquelas músicas a traduzem: seus sentimentos, seu 'mundo interno'.
Mas, ainda assim, algo a incomadava, não queria apenas que seus conflitos fossem traduzidos, mas sim respostas para suas inquetações!

"Quando eu falava dessas cores mórbidas
Quando eu falava desses homens sórdidos
Quando eu falava desse temporal
Você não escutou Você não quer acreditar
Mas isso é tão normal
Você não quer acreditar
Que eu apenas era
Cavaleiro marginal lavado em ribeirão"